João Pedro Stédile: "Não aceite as ordens das oligarquias" |
Estimada Presidenta,
Nesse ano já lhe escrevemos diversas cartas,
algumas pessoais e outras coletivas de nossos movimentos sociais do
campo. A senhora nunca pode responder ou simplesmente seus auxiliares
nem lhe entregaram. Por isso resolvi escrever de forma publica...(vai
que alguém do palácio ainda lê a Caros Amigos..).
Gostaria de lhe informar sobre o que vem acontecendo na chapada do
Apodi, interior do Rio Grande do norte. Estive por lá nesses dias e
vi de perto a trágica ação do governo federal. Nesse município há
muitos assentamentos de reforma agrária e mais de 600 famílias que
vivem na chapada, na forma de agricultura familiar, produzindo alimentos
sadios e o melhor mel do Brasil.
Agora, o DNOCS sob comando da velha oligarquia nordestina,, fez um
projeto de irrigação cujas obras passam de 200 milhões de reais. O
projeto é um absurdo técnico segundo os professores da universidade de
Mossoró, pois planeja captar água de barragem existente no rio Apodi,
que já tem volume de água insuficiente,e empurrar com energia eletrica
cem metros acima, ao longo de 10 km, para irrigar o planalto da
chapada, aonde já vivem 600 famílias. Para isso, o Dnocs preparou e a
senhora assinou a desapropriação da área de 13 mil hectares, para fins
de interesse publico. E as famílias já estão sendo visitadas,
humilhadas, ameaçadas, escorchadas, e muitas delas aceitaram sair, por
5, 6, 10 mil reais!
Depois da área “limpa” das famílias que lá viviam há décadas e instalado
os canais, os lotes de terra serão licitados para empresas cultivarem
frutas para exportação em monocultivo e com alto nível de uso de
agrotóxicos. E no maximo, caberá ainda 25% dos lotes para eventuais
agricultores familiares que se dispuseram a cultivar as frutas para as
empresas que vão controlar toda produção e comercialização.
A área é atualmente um verdadeiro paraíso agroecologico. Sua
contaminação com agrotóxicos afetará não só os 13 mil hectares, mas
toda região, já que inclusive muitas empresas fazem pulverização aérea
para a banana, como já acontece no outro lado da chapada no estado do
Ceara.
As obras já foram licitadas e lá estão as maquinas das empresas mui
amigas das oligarquias locais.
Não pode existir projeto mais absurdo que este. Tirar famílias que
vivem bem, para fazer um projeto de irrigação que só vai beneficiar
meia dúzia de empresas para produzir frutas para exportação. Não
seria mais racional criar mecanismos de irrigação para as famílias
que lá vivem, com açudes, cisternas e poços artesianos? Aproveitar a
açude existente para ajudar a irrigar por gravidade, sem maiores
custos, uma imensa área que fica abaixo da barragem,e que hoje é
ocupada por centenas de famílias que cultivam inclusive arroz?
No mesmo município há um acampamento, com mais de mil famílias de
sem-terras, reivindicando a desapropriação de diversas grandes
propriedades improdutivas que poderiam ser também irrigadas e assentadas
essas famílias. ´
É evidente que os interesses dos políticos locais são apenas as obras e
seus volumosos recursos públicos ali aplicados, que só sabe Deus o
verdadeiro destino. Eles não se preocupam com as famílias, nem com o
desenvolvimento da economia local.
Estive visitando a feira em Apodi. Fiquei impressionado com a variedade
de frutas e legumes oferecidas pelos agricultores da região, todos
eles produzidos sem agrotóxicos e gerando renda e bem estar para as
famílias.
Todas as entidades da região, o Sindicato de trabalhadores rurais, a
CPT, os bispos da regional nordeste, os técnicos da universidade, a
Marcha mundial de mulheres, as entidades ambientalistas, a ASA
(articulação do semi-arido) a articulação nacional de agroecologica, o
INCRA,. Todos são contra. Menos DNOCS e seus poderosos políticos
mandantes.
Presidenta Dilma, não suje sua biografia acobertando esse tipo de
práticas.
A senhora mesmo se comprometeu conosco, de forma publica, em janeiro de
2012, durante o FSM em Porto alegre, de que iria priorizar o
assentamento de agricultores familiares em todos perímetros irrigados do
nordeste. E na prática vem ocorrendo a expulsão de famílias em função
dos projetos. Não sei se a senhora sabe, mas existem atualmente
mais de 100 mil lotes vagos em projetos de irrigação em todo nordeste,
que poderiam beneficiar famílias de sem-terras e agricultores
familiares. E nada acontece na pratica.
Certo de suas providencias imediatas, lhe envio saudações desesperadas
dos agricultores de Apodi.
Atenciosamente
Joao Pedro Stedile
OS. Esperamos que o Ministério Público tão cioso em abraçar causas que
dão espaços na mídia, investigue a quem interessa esse tipo de obra
que só gera desperdício de milhões de reais de dinheiro publico, vão lá
em Apodi ver o que está acontecendo, para saber se a aquelas obras tem
algum interesse publico?
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